Nova estratégia de comunicação é voltada para reconstruir imagem do presidente ‘paz e amor’, de olho em 2026
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai tentar reverter a queda de popularidade no palanque. Em pouco mais de uma hora de entrevista, a primeira deste ano, Lula indicou a nova estratégia de comunicação, preparada pelo novo ministro e marqueteiro Sidônio Palmeira, para dissipar desconfianças e desmentir que o governo está sem rumo. Daqui para a frente, ele sairá mais do gabinete no Palácio do Planalto e voltará às ruas.
A estratégia foi traçada para pôr um freio de arrumação nos comentários de que Lula 3 segue à deriva, com um ministro da Fazenda enfraquecido e o Centrão dando as cartas em tudo. A avaliação no Planalto é de que Lula não chegará a 2026 em condições de concorrer a novo mandato se a crise atual – que está longe de se resumir à comunicação – não for atacada desde já.
Para acalmar o mercado, Lula defendeu Fernando Haddad – criticado agora até pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab, que é secretário de Tarcísio de Freitas, embora o partido controle três ministérios – e garantiu que não haverá irresponsabilidade fiscal em seu governo. Lembrou seu histórico de defesa do superávit primário em outros mandatos, disse que rombo só existiu na gestão passada, sem nunca citar o nome de Jair Bolsonaro, e afagou o novo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, apesar do aumento dos juros.
A disputa de 2026 pairou sobre toda a entrevista, na qual Lula procurou exibir um estilo “paz e amor” 3.0. No Salão Leste do Planalto, ele fez o que pôde para desconversar sobre a reforma ministerial, sob a justificativa de que não há nada definido. Mas não conseguiu.
“Se pudesse falar, eu falaria”, afirmou o presidente, no último minuto, quando questionado se os atuais presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de saída dos cargos, iriam para o governo. “O que eu quero é que Pacheco seja governador de Minas Gerais”, disse.
O mais curioso de tudo, porém, foi o jeito Lula de confirmar Gleisi Hoffmann no ministério sem nada anunciar. Primeiro, ao responder a uma pergunta direta sobre a entrada da presidente do PT no núcleo duro do governo, ficou um bom tempo falando sobre vários outros assuntos.
Questionado novamente sobre Gleisi, Lula disse que havia esquecido a pergunta principal, tática usada com frequência por ele quando não quer ou não pode responder. Em seguida, teceu vários elogios à presidente do PT: afirmou que ela tem “condições de ser ministra de muitos cargos”, que é “um quadro muito refinado” e possui “competência para ser ministra em qualquer país do mundo”.
Como mostrou o Estadão, o cargo escolhido para Gleisi é o da Secretaria-Geral da Presidência, hoje ocupada por Márcio Macêdo. A pasta só mudará se o presidente resolver fazer algum ajuste de última hora no desenho da reforma ministerial. Apesar de dizer não ter conversado com Gleisi sobre o assunto, Lula esteve com ela e com outros ministros do PT em mais de uma ocasião neste mês para falar sobre a necessidade de trocas na equipe.
Além de enaltecer Haddad – que, nos últimos tempos, sofreu derrotas impostas pelo próprio Planalto, como o recuo sobre as medidas do Pix –, o presidente também elogiou Gleisi e a defendeu das críticas. Nos bastidores, o “fogo amigo” no governo já começou, com ministros dizendo que a petista vai querer fazer cada vez mais contraponto a Haddad para disputar os rumos do terceiro mandato de Lula.
“O pessoal diz que ela é muito radical. Ora, para ser presidente do PT, tem que falar a linguagem do PT. Se não quiser, que vá para o PSDB”, argumentou o chefe do Executivo. Foi a senha de Lula para mostrar que, no Planalto, Gleisi adotará retórica mais branda.
Embora contrariado com o método que partidos da base aliada, como o PSD, o PP e até o Republicanos, têm usado para pressioná-lo a fazer mudanças no primeiro escalão, Lula também procurou despistar quando indagado sobre esse tema. Disse ter dado risada quando soube das críticas de Kassab, falou que os detratores de Haddad deveriam lhe pedir desculpas e afirmou que as eleições de 2026 estão muito longe.
Na prática, porém, é o modo reeleição que move o governo Lula. “Quem quiser derrotar a política do meu governo vai ter que aprender a fazer luta de rua”, anunciou o presidente. Nem precisava dizer mais nada. Com essa declaração, Lula deu o tom de que, embora afirme não estar pensando em eleição, 2026 não apenas já começou como toda a estratégia do governo gira em torno disso.
Dizem no PT que Lula é como a Bíblia: todos leem, mas cada um interpreta como quer. Ao que tudo indica, é por aí mesmo.
Análise por Vera Rosa
Repórter especial do ‘Estadão’. Na Sucursal de Brasília desde 2003, sempre cobrindo Planalto e Congresso. É jornalista formada pela PUC-SP. Escreve às quartas-feiras
Por Estadão