Texto também veta o início do tratamento com hormônios antes dos 18 anos e de alguns procedimentos cirúrgicos antes dos 21

O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou no Diário Oficial da União (DOU), nesta quarta-feira, uma resolução em que revisa os critérios para o atendimento de pessoas trans. A principal mudança no texto é a proibição do bloqueio hormonal para crianças e adolescentes trans com incongruência ou disforia de gênero. Além disso, a entidade vetou o início do tratamento com hormônios antes dos 18 anos e restringiu o acesso a alguns procedimentos cirúrgicos a menores de 21.
Pessoas trans são indivíduos cujo gênero não corresponde àquele atribuído ao nascimento. O caso de incongruência é definido pelo Conselho como a “discordância acentuada e persistente”, sem necessariamente levar a um sofrimento, e o de disforia de gênero como aqueles em que a incongruência leva a um “grave desconforto ou sofrimento”.
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O bloqueio hormonal é uma estratégia reversível utilizada para interromper a produção de hormônios sexuais em crianças e adolescentes trans. Com isso, impede o desenvolvimento de características físicas do sexo de nascimento durante a puberdade até que esses jovens tenham idade suficiente para começar a transição de gênero. Exemplos disso seriam impedir a menstruação e o desenvolvimento das mamas ou surgimento de pelos, do pomo de adão e alterações na voz.
A resolução anterior que estabelecia as regras, de 2019, autorizava a realização do bloqueio a partir do início da puberdade em caráter experimental dentro de protocolos de pesquisa de hospitais universitários e/ou de referência para o Sistema Único (SUS). Agora, a prática não é mais permitida. O tratamento segue autorizado somente para casos médicos de crianças com puberdade precoce ou outras doenças endócrinas.
Já sobre a hormonioterapia, que utiliza hormônios como testosterona e estrogênio para induzir características biológicas do gênero com a qual a pessoa trans se identifica, as regras antigas autorizavam o início a partir dos 16 anos. Agora, apenas maiores de idade poderão acessar o tratamento.
Os procedimentos cirúrgicos, como aumento ou retirada da mama, já eram restritos àqueles acima de 18 anos. No entanto, as cirurgias de redesignação de gênero com potencial efeito esterilizador passaram a ser permitidas apenas a partir dos 21 anos. Os procedimentos do tipo são a neovulvovaginoplastia (criação de uma vagina com retirada de testículos para mulheres trans) e a histerectomia e ooforectomia bilateral (remoção do útero e dos ovários para homens trans).
Antes mesmo de ser publicada, a resolução já era alvo de críticas, principalmente pela restrição ao tratamento para crianças e adolescentes trans. O Ministério Público Federal (MPF) instaurou procedimento para apurar a legalidade da resolução após uma denúncia da Associação Mães pela Diversidade e de nota técnica publicada pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
“Estamos diante de mais uma ação coordenada que dialoga com a crescente agenda antitrans em nível global, marcada por políticas e discursos que atacam diretamente a existência, a dignidade e os direitos básicos da nossa população”, diz a associação, que classifica a medida como uma “decisão política” que “ignora evidências científicas”, no documento.
“A revogação de diretrizes que garantiam acompanhamento e cuidado adequados para crianças e jovens trans sem nenhuma justificativa aceitável representa um ataque deliberado ao futuro dessas pessoas, com impactos profundos e irreversíveis em sua saúde mental, segurança e bem-estar coletivo de nossa comunidade”, continua a entidade.
Os grupos comunicaram a preocupação de familiares de crianças com variabilidade de gênero ou adolescentes trans que sofrem de disforia de gênero e que têm acesso a procedimentos terapêuticos como bloqueio puberal e hormonização cruzada pelas regras anteriores. Além disso, a Antra destaca que jovens com 18 anos de idade já completos se preparavam para realização, em breve, de cirurgias de redesignação sexual.
O CFM tem 15 dias para prestar informações ao procurador regional dos Direitos do Cidadão no Acre, Lucas Costa Almeida Dias, sobre os fundamentos técnicos e jurídicos que fundamentaram a nova normativa.
Por Mais Goiás