A falta de movimentações significativas nos grandes números de uma pesquisa para outra costuma ser o terror de analistas, mas na heterodoxa eleição de São Paulo até isso embute uma notícia relevante.
Como mostrou o Datafolha, não houve a esperada (e por muitos temida) espichada de Pablo Marçal (PRTB), o que significa que seu adversário direto no campo da direita, Ricardo Nunes (MDB), respira.
Se houve alguma mexida relevante foi no eleitorado que se identifica como bolsonarista, em que a vantagem do coach sobre o prefeito caiu de 25 para 13 pontos, embora num segmento em que a margem de erro é maior, de quatro pontos.
A hipótese mais óbvia para isso é que a live de Jair Bolsonaro na sexta-feira (4) à noite, em que subiu o tom contra Marçal, tenha surtido algum efeito em trazer de volta admiradores do ex-presidente que haviam se deixado seduzir pelo influenciador.
Mas não é de se descartar que a divulgação do laudo fraudulento que liga Guilherme Boulos (PSOL) ao consumo de cocaína tenha tido seu efeito neste subgrupo. A farsa é de tal sorte grosseira e baixa que mesmo Bolsonaro, que nunca foi um exemplo de comedimento com os fatos, veio a público criticá-la. Mesmo algumas lideranças que orbitam no entorno do ex-presidente e aderiram a Marçal começam a se questionar se fizeram a opção certa.
O laudo fake poderá segurar Marçal de outras formas. Nas últimas semanas, ele vinha modulando seu comportamento na campanha para parecer mais maduro e confiável.
Versado nas técnicas da neurociência, vestiu um personagem mais humilde, que pediu perdão e buscou empatia com um público mais amplo. Começou a anunciar secretários e, num jantar com empresários e operadores do mercado financeiro, deixou boa impressão.
Mesmo adversários reconheceram que Marçal foi eficiente na arte de atrair eleitores que não simpatizaram com ele num primeiro momento. Esses neomarçalistas podem, agora, se sentir repelidos pelo infame espetáculo do laudo falso e repensar o voto, com Nunes como destino mais provável.
No caso de Boulos, embora aparentemente mais confortável pela pequena dianteira numérica apontada pela pesquisa, a preocupação é com o imponderável representado pela mais turbulenta eleição paulistana de que se tem notícia.
Ele está à frente, afinal, na margem de erro, e pode sofrer efeito negativo de uma possível subida de última hora de Tabata Amaral (PSB), embora o movimento inverso, com migração de voto da deputada para o ex-líder-sem-teto, pareça mais provável.
A campanha psolista conta que a onda de solidariedade na reta final em razão do jogo sujo de Marçal será maior do que um possível efeito negativo da revelação falsa sobre associação com as drogas.
Mas o fato é que não é possível ter certeza sobre qual destas tendências vai preponderar, o que leva tensão a PT, PSOL e, sobretudo, ao Palácio do Planalto, de onde Lula contempla o risco de sofrer uma de suas maiores derrotas políticas.