Agentes da corporação fluminense argumentam que relatório que fundamentou detenções e medidas cautelares, como o uso de tornozeleiras por Giniton Lages e comissário Marco Antonio, é inconsistente
A imagem do ex-chefe de Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa, saindo algemado de uma viatura da Polícia Federal, direto para a penitenciária federal da Papuda, em Brasília, no último domingo, surpreendeu muita gente e chocou seus colegas de corporação — alguns fazem críticas ao relatório dos investigadores da PF. Segundo o documento, as investigações indicam o delegado como o responsável pelo planejamento dos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Ele também é acusado de atrapalhar a elucidação do crime, em troca de propina, com pagamento antecipado.
A indignação de agentes, inclusive integrantes da cúpula da Polícia Civil, acirrou a tradicional animosidade com a PF. Não é de hoje que as duas instituições mantêm forte rivalidade: isso vem pelo menos desde 2007, quando o delegado da PF, José Mariano Beltrame, era secretário de Segurança do Rio. O fato de a Polícia Federal, após seis anos do duplo homicídio, apresentar uma solução para o caso, apontando como “autores intelectuais” o deputado federal Chiquinho Brazão, seu irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, e Rivaldo, deixou integrantes da Polícia Civil ressabiados. Os três foram presos anteontem.
Agentes da corporação estadual enfatizam que o relatório é baseado exclusivamente na delação do mercenário Ronnie Lessa, apontado como o assassino de Marielle e Anderson, que foi preso pelo delegado Giniton Lages, encarregado do caso à época, e escolhido por Rivaldo. Além das prisões, o ministro do STF, Alexandre de Moraes, determinou buscas e apreensões nas casas de Giniton, de seu chefe de investigação, o comissário Marco Antonio de Barros Pinto, e da mulher de Rivaldo, Érika Andrade de Araújo. Também faz parte da medida cautelar que eles usem tornozeleira eletrônica.
Um dos delegados ouvidos pelo blog Segredos do Crime alegou que todos sabem da influência da contravenção e das milícias na Polícia Civil. Para ele, o problema do relatório é não conter provas robustas. Essa indignação pode, inclusive, prejudicar o ânimo da tropa, reduzindo o ritmo das investigações.
Adido da Polícia Civil
É fato que a obtenção de evidências contundentes seis anos após o crime não é nada fácil. Até o principal elo entre matador e mandantes, que, segundo o delator, seria Edmilson da Silva Oliveira, o Macalé, foi morto em 2021 — provavelmente, por queima de arquivo. Não se pode desprezar também que Lessa conhece a Polícia Civil como ninguém. Ele foi adido, ou seja, um policial militar emprestado à corporação. Entende de técnicas de investigação, do submundo do crime e de ligações promíscuas com agentes de segurança. Ainda tem, portanto, muito a dizer, além da delação sobre as circunstâncias do assassinato de Marielle e Anderson.