De acordo com o Kremlin, a pausa de 30 dias irá acabar nesta semana e não deve ser renovada, em meio a negociações paradas para uma pausa permanente
A Rússia deve anunciar nesta quarta-feira, 16, que irá retomar os ataques em larga escala contra a infraestrutura energética da Ucrânia após uma pausa de 30 dias nos ataques energéticos. Moscou e Kiev se acusam de violar o cessar-fogo e também divergem de quando a trégua começou.
Os indícios da volta aos ataques contra a infraestrutura de energia da Ucrânia mostram que as negociações por um cessar-fogo duradouro estão travadas. A postura russa alimentou dúvidas sobre a estratégia de negociação dos Estados Unidos e destacou a relutância de Donald Trump em exercer pressão séria sobre a Rússia ou condenar seus recentes ataques, que mataram dezenas de civis ucranianos.
Embora o cessar-fogo limitado que começou no mês passado tenha abrangido apenas a infraestrutura energética, a medida foi descrita pela equipe de negociação de Trump como um passo importante rumo a uma trégua total. No entanto, a pausa foi criticada por sua imprecisão e pelas contradições entre Rússia, Ucrânia e Estados Unidos em aspectos-chave — incluindo a data em que entrou em vigor e o que foi abordado.

Trégua confusa
O Kremlin afirma que o cessar-fogo parcial — ao qual se refere como uma moratória temporária sobre ataques à infraestrutura energética — começou em 18 de março. Mas a Ucrânia afirma que a pausa começou uma semana depois, em 25 de março.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que a “moratória” está prestes a expirar e acusou a Ucrânia de não cumpri-la. Ele acrescentou que o presidente russo, Vladimir Putin, tomará uma decisão nos próximos dias.
O cessar-fogo parcial não designou nenhum grupo para mediar possíveis violações, e ambos os lados se acusaram mutuamente de ataques quase diários. O Ministério da Defesa russo alegou constantes ataques ucranianos à infraestrutura energética russa, em grande parte sem provas, embora os ataques ucranianos a refinarias de petróleo, depósitos de combustível e instalações similares russas tenham cessado.

Os ataques russos a usinas elétricas e grandes instalações ucranianas já haviam diminuído antes do cessar-fogo, mas autoridades ucranianas afirmam que a Rússia destruiu repetidamente as redes de distribuição de eletricidade em Poltava, Kharkiv, Kherson, Krivii Rih e outros locais nos últimos 30 dias.
Negociações travadas
Enquanto Trump pressiona por um progresso mais rápido nas negociações com Moscou em direção a um acordo — e expressa frustração com a falta dele — o Kremlin minimiza continuamente qualquer esperança de um acordo rápido.
Em diversas ocasiões nos últimos dias, o governo Trump anunciou que um acordo estava próximo. Mas Peskov disse na segunda-feira, 14, que não existe nenhum prazo para as negociações. “Esta é uma questão tão complexa que é quase impossível esperar resultados imediatos”.
O ministro das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, enviou uma mensagem semelhante em uma entrevista publicada na segunda-feira no jornal econômico russo Kommersant. Ele disse que a Rússia e os Estados Unidos não concordaram com nenhum dos elementos-chave de um acordo de paz.
“A resposta é não”, disse ele, acrescentando que as exigências da Rússia “não eram algum tipo de posição de negociação”.

Governo Trump
Essa não foi a mensagem que o enviado de Trump, Steve Witkoff, trouxe de Moscou. No início deste mês, ele se encontrou em Washington com Kirill Dmitriev, chefe do fundo soberano da Rússia, que está sob sanções dos EUA, e, na semana passada, se encontrou com o presidente russo, Vladimir Putin, e seu assessor sênior, Yuri Ushakov, em São Petersburgo, por “quase cinco horas”.
Mais tarde, ele disse à Fox News que a reunião foi “impressionante” e que “poderíamos estar à beira de algo que seria muito, muito importante para o mundo em geral”.
“E, perto do fim, chegamos ao principal pedido de Putin: uma paz permanente aqui. Então, além do cessar-fogo, obtivemos uma resposta para isso”, disse Witkoff, sem dar mais detalhes.

Em meio às negociações, Witkoff afirmou que havia espaço para um acordo econômico entre os EUA e a Rússia como parte da trégua. “Acredito que existe a possibilidade de remodelar a relação Rússia-Estados Unidos por meio de algumas oportunidades comerciais muito atraentes que, na minha opinião, também proporcionam estabilidade real à região”, disse ele.
Ele também afirmou que o futuro dos cinco territórios ucranianos anexados (mas não totalmente conquistados) pela Rússia era fundamental, além de negar a entrada da Ucrânia na Otan.
Analistas criticaram a abordagem de Witkoff após ele ter repetido uma série de demandas do Kremlin para o fim da guerra. Críticos afirmam que o enviado parece não ter conhecimento das táticas de negociação de Putin ou da propaganda do Kremlin sobre o contexto político do conflito.
Witkoff participou de longas reuniões sozinho com Putin, sem uma equipe de especialistas do Departamento de Estado que pudessem aconselhá-lo sobre a política externa do Kremlin, seu histórico de interferência na Ucrânia ou sua falsa narrativa sobre a história da Ucrânia, que Putin não considera um país real./com W.Post
Por Estadão