Urbanização crescente aumenta ameaças a esses animais, que têm papel ecológico em áreas de Mata Atlântica; Ibama diz que vai apurar denúncias de venda de parte dos primatas na internet

niciativas em diferentes Estados da Mata Atlântica, incluindo São Paulo, estão reintroduzindo macacos-bugios em risco de extinção em seu habitat natural. A principal ameaça para eles é a febre amarela, mas esses macacos também sofrem com a fragmentação das áreas verdes e mais riscos da expansão urbana, como choques elétricos e atropelamentos. A lista de perigos inclui até anúncios de venda de peles dos macacos.
A caça de animais silvestres é proibida no Brasil e só pode ocorrer com aval expresso do Ibama, ligado ao Ministério do Meio Ambiente. Segundo o órgão, não há criador de bugio autorizado para uso da pele do macaco. Cabem sanções ao vendedor e comprador.
O Estadão identificou dois anúncios de venda de pele de bugio em sites de leilão nacionais. Os lotes foram vendidos respectivamente em 2022 pelo leiloeiro Daniel Chaieb e em 2024 pela Santayana Casa de Leilões, ambos em Porto Alegre. Na Santayana, o valor da venda foi de R$ 170.
Em nota, a equipe jurídica da Santayana afirma que a empresa segue a lei, “se restringe à intermediação de bens pertencentes a terceiros” e “repudia qualquer forma de maus-tratos ou exploração de animais”. Diz ainda se tratar de peça dos anos 1960, leiloada “como item de antiguidade”.
A Daniel Chaieb não se pronunciou até a publicação da reportagem. O Ibama diz que vai apurar os casos.



Especialistas acreditam que existem onze espécies de macaco bugio no Brasil, sobretudo na Mata Atlântica.
O bugio-ruivo está na lista dos 25 primatas mais ameaçados de extinção no mundo.
O bugio tem importante função ecológica, pois ajuda na dispersão de sementes na mata.
Segundo Roberto Cabral, analista ambiental do Ibama que já realizou operações de apreensão em contextos semelhantes, mesmo que a pele seja anterior à lei de proteção da fauna, de 1967, a infração não é atenuada: “A partir do momento que a pele é comercializada, (o vendedor) comete um crime atual e tem de responder por ele hoje, assim como quem adquire”, afirma.
Em um caso como esse, infratores autuados pelo Ibama respondem administrativamente. A multa é de R$ 500 pela caça e uso de espécies silvestres não ameaçadas e de R$ 5 mil se o animal constar nas listas oficiais brasileiras ou internacionais de fauna ameaçada de extinção, como é o caso do bugio-ruivo.
O órgão ambiental também comunica o Ministério Público, ao qual cabe a decisão de levar a denúncia à Justiça. Na esfera criminal, a pena é de seis meses a um ano de prisão e multa, a ser definida pelo magistrado.
“Já fizemos apreensão de bugio mantido em cativeiro, de bugio morto na Amazônia, mas aí o interesse das pessoas era comer (a carne). A pele vendida como apetrecho em si não tínhamos visto ainda”, diz Cabral.
Dizimados pela febre amarela na zona norte de São Paulo e reintroduzidos aos poucos no Parque da Cantareira, os bugios resistiram em áreas protegidas em Parelheiros, na zona sul. Isolados em fragmentos de mata cada vez menores e entrecortados pela urbanização, os macacos também são ameaçados pela endogamia (acasalamento entre parentes) e queda da variabilidade genética.
“É uma espécie ameaçada de extinção não só pela febre amarela, mas por todos os impactos que temos causado”, diz o biólogo Felipe Fantacini, do Instituto Ampara Animal, que apoia o projeto de reintrodução da Prefeitura da capital. A crise climática, segundo ele, tem piorado o cenário.
REPORTAGEM: JULIANA DOMINGOS DE LIMA; EDITOR DE METRÓPOLE: VICTOR VIEIRA; EDITORES-ASSISTENTES DE METRÓPOLE: LÍVIA MACHADO E RAPHAEL RAMOS; EDITORA DE INFOGRAFIA: REGINA ELISABETH SILVA; EDITORES-ASSISTENTES DE INFOGRAFIA: ADRIANO ARAUJO E WILLIAM MARIOTTO; DESIGNER MULTIMÍDIA: LUCAS ALMEIDA; INFOGRAFISTAS MULTIMÍDIA: GLAUCO LARA E MARCOS BRITO.
CONTRIBUIÇÃO: MARCELLO NARDI (SVMA); INSTITUTO AMPARA ANIMAL; SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E MEIO AMBIENTE DE SP (SVMA); CENTRO NACIONAL DE PESQUISA E CONSERVAÇÃO DE PRIMATAS BRASILEIROS (CPB); ICMBIO-MMA, SECRETARIA DE SAÚDE DO ESTADO DE SP E IBAMA.
Por Estadão