Governador de São Paulo aposta na gratidão e acompanha Bolsonaro nos momentos mais difíceis; não causará estranhamento ver Tarcísio visitar ex-presidente na prisão
Apesar de interditar a direita ao insistir numa candidatura presidencial, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) faz um certo favor ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ao dizer que não passará seu bastão a ele. Com a recusa, Bolsonaro livra Tarcísio — até certo ponto — da contaminação direta do bolsonarismo raiz.
Tarcísio precisa de votos dos apoiadores de Bolsonaro para uma eventual — e cada vez menos distante — candidatura presidencial. Isso é fato. Mas a possibilidade de arregimentar apoio sólido e consistente ao seu nome para pleitear o Planalto só se dará ao consolidar a imagem de representante da Centro-direita, de equilíbrio.
Por outro lado, receber o bastão de Bolsonaro representa comprometimento com todas as bandeiras do capitão. Seria como assinar uma procuração para representá-lo, com todas as bandeiras, que incluiriam o histórico, por exemplo, antivacina e contra o sistema eleitoral brasileiro. Algo que inclusive vai levar Jair Bolsonaro ao banco dos réus e, provavelmente, para a prisão.
O problema da negativa de Bolsonaro é a forma. O ex-presidente constrange publicamente o governador, fazendo a afirmação ao seu lado, em duas situações seguidas. A mais recente, na noite dessa segunda-feira, 24. “Eu só passo o bastão, já falei, Tarcísio, depois de morto. Você sabe disso”, disse Bolsonaro em entrevista ao podcast Inteligência Ltda.
E por qual motivo Tarcísio de Freitas se submete? O governador de São Paulo é, por ora, o nome da direita com maior viabilidade política para enfrentar Lula em 2026, segundo as pesquisas.
Quadro técnico na área de infraestrutura, Tarcísio trabalhou nas mais variadas gestões do governo federal. Com Dilma Rousseff, com Michel Temer, com Bolsonaro. Mas foi este último que viu nele potencial político e insistiu em sua candidatura ao governo de São Paulo.
O projeto político de Bolsonaro nesse caso deu certo. Tarcísio tem hoje 61% de aprovação de seu governo, segundo pesquisa Quaest divulgada em 27 de fevereiro. Segundo levantamento do mesmo instituto publicado em 3 de fevereiro, o governador paulista é conhecido por 55% do eleitorado brasileiro.
O governador, então, aposta na gratidão e acompanha o ex-presidente nos momentos mais difíceis, as vésperas do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Afastar-se seria como pôr um rótulo de traidor que despertaria a fúria bolsonarista.
Não causará nenhum estranhamento, portanto, ver Tarcísio visitar Bolsonaro na prisão, se esse for o futuro próximo do ex-presidente.
Análise por Roseann Kennedy
Roseann Kennedy é jornalista pós-graduada em Ciência Política e Economia. Há mais de 20 anos em Brasília, cobre as relações entre os poderes e os bastidores da política. Foi colunista política na CBN e Globo News, editora-chefe e âncora no SBT e SBT News. Pernambucana, torcedora do Náutico, mas também apaixonada pelo Palmeiras.
Por Estadão
