Divulgação dos arquivos, que durou um dia inteiro, gerou até mesmo novas teorias da conspiração entre alguns partidários do presidente Donald Trump
Durante dias, a Procuradora Geral Pam Bondi falou sobre a divulgação dos “arquivos Epstein”, documentos supostamente secretos que o governo federal dos EUA tem sobre alguns dos homens poderosos que estavam na órbita do financista Jeffrey Epstein.
Mas as cerca de 200 páginas de documentos que Bondi divulgou na quinta-feira, 27, continham poucas informações novas que apontassem para irregularidades cometidas por alguém que não fosse Epstein, um criminoso sexual registrado que morreu na prisão. A maior parte dos documentos consistia em registros de voos dos aviões de Epstein – há muito tempo tornados públicos – e informações de contato de centenas de associados, além de breves descrições de itens encontrados em suas residências.
A divulgação foi anunciada como um gesto que inaugurou uma nova era de transparência no Departamento de Justiça. Porém, a alardeada primeira divulgação de documentos, que Bondi apresentou como “notícia de última hora” em uma aparição na Fox News na noite de quarta-feira, pareceu ser principalmente um teatro político. Sua confusa divulgação, que durou um dia inteiro, gerou até mesmo algumas novas teorias da conspiração entre alguns partidários do presidente Donald Trump, que veem a investigação de Epstein como uma fonte para outras conspirações.
Na tarde de quinta-feira, Bondi e Kash Patel, diretor do FBI, ofereceram uma prévia dos documentos a vários influenciadores conservadores, alguns dos quais saíram do encontro agitando fichários brancos volumosos com o rótulo “The Epstein Files: Fase I” (”Arquivos Epstein: Fase 1″). Mais tarde, um deles chamou o documento de “lembrança interessante”.
“Se houver lacunas, nós as encontraremos”
Até o meio da tarde, o Departamento de Justiça não havia publicado o conteúdo. E Bondi estava sendo criticada nas mídias sociais por aqueles que haviam acreditado em sua palavra na noite anterior. A personalidade conservadora Glenn Beck publicou na plataforma social X: “Os arquivos Epstein são uma piada total”, e perguntou: “Quem está subvertendo o POTUS [sigla para o presidente dos EUA]?”.
Bondi respondeu prometendo mais documentos. Mais tarde, ela disse que uma “fonte” no escritório de campo do FBI na cidade de Nova York havia lhe dito que o departamento havia retido “milhares” de páginas desconhecidas de documentos relacionados a Epstein e que ela estava determinada a obtê-los, de acordo com uma carta que seu porta-voz forneceu aos repórteres.
Os documentos foram divulgados na quinta-feira, juntamente com uma declaração de Patel que dizia: “Se houver lacunas, nós as encontraremos. Se os registros foram ocultados, nós os descobriremos”.
Ainda assim, alguns republicanos do Congresso foram ao X para expressar seu descontentamento com as informações divulgadas por Bondi.
“ISSO NÃO É O QUE NÓS OU O POVO AMERICANO PEDIMOS e é uma completa decepção. DÊ-NOS AS INFORMAÇÕES QUE PEDIMOS!”, escreveu a deputada Anna Paulina Luna, dos Republicanos.
Fortuna de US$ 600 milhões
Epstein, que abandonou a faculdade e se autoproclamava um gênio das finanças, se matou em agosto de 2019 – um mês após sua prisão por acusações federais de tráfico sexual.
Acredita-se que Epstein tenha abusado sexualmente de mais de 200 meninas adolescentes e mulheres jovens ao longo de três décadas. Durante esse período, ele acumulou uma fortuna no valor de US$ 600 milhões e fez amizade com algumas das pessoas mais poderosas e famosas do mundo.
Incluída nos documentos, que foram finalmente publicados na noite de quinta-feira, havia uma lista totalmente redigida de 254 pessoas descritas como massagistas.
Muitos dos nomes em negrito associados a Epstein vieram à tona pela primeira vez em 2015, quando o Gawker publicou seu chamado “livro negro de nomes, números e endereços”.
Essa lista inclui o magnata do varejo Leslie Wexner, o magnata do capital privado Leon Black, o cofundador da Microsoft Bill Gates e o capitalista de risco Reid Hoffman. Todos esses homens disseram que se arrependeram de sua associação com Epstein.
Também se sabe há muito tempo que Trump, o ex-presidente Bill Clinton, o príncipe Andrew do Reino Unido e celebridades como Kevin Spacey e Naomi Campbell eram amigos de Epstein em algum momento, e alguns viajaram nos aviões particulares de Epstein, de acordo com registros de voos divulgados anteriormente, testemunhos de julgamentos e processos judiciais.
O registro de voo mais notável foi um documento de 118 páginas produzido durante o julgamento criminal de Ghislaine Maxwell, uma das associadas de longa data de Epstein e ex-namorada. Ela foi condenada em 2021 sob a acusação de ter ajudado Epstein em suas atividades de tráfico sexual.
“Lista de clientes”?
Há anos, os teóricos da conspiração acreditam que há um grande complô do governo para ocultar não apenas a causa da morte de Epstein, mas os nomes de homens poderosos que também abusaram de algumas das vítimas.
Em plataformas de mídia de direita, como a Fox News e o próprio serviço de Trump, Truth Social, há muito tempo se fala de uma “lista de clientes de Epstein” que detalha os nomes dos homens para os quais Epstein adquiriu mulheres. Mas nunca houve referência a qualquer “lista de clientes” em nenhum dos processos civis movidos pelas vítimas.
Antes de entrar para o governo Trump, Bondi alimentou parte dessa especulação ao falar em entrevistas à mídia sobre a recusa do governo em liberar os documentos de Epstein.
O FBI também se recusou a liberar alguns documentos solicitados pelos advogados das vítimas e pela mídia. Em outubro, o FBI rejeitou uma solicitação da Lei de Liberdade de Informação apresentada pelo The New York Times, que buscava uma lista de todos os itens apreendidos por agentes federais quando eles revistaram as residências de Epstein em Nova York e nas Ilhas Virgens Americanas após sua prisão em julho de 2019.
Os documentos divulgados por Bondi podem incluir descrições parciais de alguns desses itens apreendidos pelos agentes federais. Sob o título “lista de provas”, há breves descrições de itens como “fita VHS”, “envelope contendo 4 CDs” e “foto retratando duas meninas”.
Mais de duas dúzias de vítimas de Epstein se juntaram a uma ação judicial acusando o FBI de não ter conduzido corretamente as investigações anteriores sobre suas atividades e de ignorar as queixas apresentadas pelas vítimas.
Jordan Merson, cujo escritório de advocacia está cuidando desse processo, disse que Bondi havia dado um bom primeiro passo e que esperava que isso “a levasse a levar a sério a dor das vítimas” que estavam processando o FBI.
c.2025 The New York Times Company
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Por Estadão
