Ele estima que o País tenha um crescimento entre 2% e 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o que seria suficiente para garantir um equilíbrio macroeconômico
O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, afirmou em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast que existe uma compreensão dentro do governo de que é necessário garantir uma desaceleração na economia para evitar um descontrole inflacionário. Ele afirmou que a equipe econômica será rigorosa na tentativa de garantir uma política fiscal mais contracionista no primeiro semestre do ano e, assim, ajudar no processo de acomodação dos indicadores.
“Isso resolve? Não, mas contribui na margem. A política fiscal atuar de uma forma contracionista colabora para a harmonização da política monetária. Neste momento, para garantir esse processo, esse choque inicial, eu acho que tem um papel importante”, disse. Ceron citou, por exemplo, que a execução dos gastos públicos neste início de ano já está mais rígida, com limitação de um dezoito avos (1/18) nas despesas por parte dos ministérios.
Recentemente, o ministro Fernando Haddad indicou que é preciso desacelerar a economia para que o País não seja prejudicado em outros aspectos, como na questão inflacionária. Ele comparou a taxa do PIB a um carro de fórmula 1. “Se você entende que está havendo uma disfuncionalidade, é que nem você dirigir o carro de Fórmula 1: acelerar é sempre bom? Depende. Tem uma curva na sua frente, tem um muro na sua frente, você está com gasolina? Você está com o pneu adequado? Você tem de olhar para tudo”, disse Haddad.
Agentes de mercado têm desconfiança se o governo embarcará integralmente nessa visão, tendo em conta ainda as eleições de 2026. Ceron argumentou, contudo, que existe compreensão dentro da gestão Lula sobre essa necessidade.
O secretário estima que o País registre um crescimento entre 2% e 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o suficiente para garantir um equilíbrio macroeconômico no País. A projeção, segundo ele, se dá pelo fortalecimento do agronegócio, e não pelo consumo das famílias, fator que geraria maior pressão sobre a inflação. O crescimento de 3,5% do PIB sinaliza estar acima do potencial, avaliou ele.
Centro da meta
As próximas sinalizações do governo na política fiscal, de acordo com agentes econômicos, devem passar pelo orçamento e, principalmente, pelo contingenciamento e bloqueio de gastos. Segundo Ceron, a equipe econômica está discutindo caminhos formais para perseguir o centro da meta fiscal estabelecida pelo arcabouço, de déficit zero em 2025.
Ele afirma que o Tribunal de Contas da União (TCU) deu parecer técnico, mas não definitivo, de que o governo poderia perseguir o centro da meta, sem precisar contingenciar no limite para atingir apenas a banda inferior. “A gente está discutindo quanto a gente consegue ou não, formalmente, trabalhar dessa forma. Do ponto de vista gerencial, há sim o intuito de buscar o centro da meta”, disse.
Ao longo do ano passado, a interpretação adotada pelo Executivo era de que não seria possível manter o orçamento contingenciado se houvesse receitas suficientes para cumprir a meta, mesmo que no limite inferior da banda – de déficit de 0,25 ponto porcentual do PIB.
Resultados do arcabouço fiscal
Ceron defendeu o arcabouço fiscal e disse que o instrumento já apresentou resultados e está funcionando, além de ter espaço para ser aperfeiçoado. Durante a coletiva sobre o resultado do governo central em 2024, Ceron ponderou que o delta de recuperação fiscal no primeiro ano de vigência do arcabouço é muito relevante, ainda que haja ponderações sobre gastos extraordinários e o pagamento de precatórios. Ele disse que, na última década, nenhum modelo de regra fiscal funcionou melhor do que o arcabouço.
“Foi o segundo melhor resultado fiscal da década no primeiro ano de vigência e o terceiro menor patamar de despesas do PIB na década. Podemos discutir se poderia ser mais agressivo ainda, mas em poucos momentos da nossa história recente podemos encontrar alguém que fale que trouxe resultados melhores do que isso”, disse.
Ceron reconhece que os bons resultados não significam que a situação está resolvida e disse que, embora o arcabouço esteja funcionando bem, pode ser aperfeiçoado, o que é “bom e saudável”. Ele também disse que o debate sobre ritmo do ajuste fiscal é legítimo, e fez a ressalva sobre o cenário externo desafiador, indicando que é preciso atenção para acompanhar as decisões do Federal Reserve (Fed) e o que elas irão significar.
Mais medidas fiscais
Ele voltou a dizer que, se forem necessárias mais medidas fiscais para garantir os resultados buscados pelo governo, elas serão adotadas. “Claro que dá para discutir se a intensidade (da recuperação) está adequada, se precisa acelerar, se precisa de sinalização mais forte, debate é legítimo”, afirmou Ceron. Além disso, a equipe vai desenhar medidas para compensar eventuais frustrações de receita, como fez em 2024, comentou.
“Não dá para adiantar quais, porque precisamos esperar ver o que a Receita vai prever em suas reanálises, em quanto vai se frustrar de receita”, disse. Ele ainda argumentou que o pacote fiscal aprovado no fim do ano passado não é trivial e que o momento é de fazer um balanço do efeito das medidas.
Além disso, o governo ainda aguarda a eleição das mesas no Congresso para debater com a nova cúpula quais medidas de incremento de receita que já estão no Legislativo poderão ou não ser aprovadas. “Das medidas que serão ou não aprovadas precisamos esperar Congresso voltar. Fazer articulação política para saber o que é possível e o que não é possível”, disse Ceron, citando ainda que nem todas as medidas de compensação da desoneração da folha se efetivaram e que, portanto, esse assunto com o Congresso ainda está em aberto.
“Algumas medidas não performaram e, portanto, temos ainda não compensação. Não sei como será tratado, mas é questão em aberto que precisa ser discutida”, disse o secretário, repetindo ainda que em 2025 buscará um resultado primário melhor que o verificado em 2024.
Dominância fiscal
Ceron, refutou a tese de que o Brasil se encontra em um cenário de dominância fiscal. Ele avaliou que há casos em que falta serenidade para análises de cenários mais longos, que prejudicam esse debate, que fica dessa forma muito focado no curtíssimo prazo.
“Não há um exemplo razoável de que isso tenha acontecido com um País que tenha resultados fiscais como o nosso”, disse. “Não tenho dúvidas de que não estamos em cenário de dominância fiscal”, frisou.
O secretário ainda ponderou que vê momentos em que uma síndrome de vira-lata se impõe e se tenta colocar enfoque negativo – mas frisou que o País está no caminho de recuperação fiscal.
Ele reafirmou a importância de harmonização das políticas fiscal e monetária para a reancoragem da inflação, mas destacou os bons indicadores da economia do País, sem menosprezar os desafios.
Por Estadão