Juiz de Seattle afirmou que medida é ‘flagrantemente inconstitucional’; documento assinado por Trump na segunda-feira afirma que os filhos de não cidadãos não estão sujeitos à jurisdição dos EUA
Um juiz federal de Seattle bloqueou temporariamente nesta quinta-feira, 23, a ordem executiva assinada pelo presidente Donald Trump que restringe o direito à cidadania americana por nascimento nos Estados Unidos.
“Esta é uma ordem flagrantemente inconstitucional”, afirmou o juiz John Coughenour durante uma audiência em resposta a uma ação judicial contra a medida executiva apresentada por quatro Estados.
O caso é um dos cinco processos movidos por 22 Estados dos EUA, além de vários grupos de direitos dos imigrantes em todo o país, contra a ordem executiva de Trump. Os processos incluem depoimentos pessoais de procuradores-gerais que são cidadãos dos EUA por direito de nascença e nomeiam mulheres grávidas que têm medo de que seus filhos não se tornem cidadãos dos EUA.
Após retornar à Casa Branca, Donald Trump assinou uma série de ordens executivas destinadas a reformular o sistema migratório dos Estados Unidos, incluindo uma que busca restringir o direito de solo previsto na Constituição.
A ordem executiva está programada para entrar em vigor em 19 de fevereiro. Ela afirma que os filhos de não cidadãos não estão sujeitos à jurisdição dos Estados Unidos e ordena que as agências federais não reconheçam a cidadania de crianças que não tenham pelo menos um dos pais que seja cidadão.
Se aplicada, a ordem impediria a emissão de passaportes, certidões de nascimento ou outros documentos para crianças cujas mães estejam no país de forma ilegal ou temporária, e cujo pai não seja cidadão americano.
Coughenour, nomeado por Ronald Reagan, começou a audiência questionando os advogados do governo, dizendo que a ordem “confunde a mente”.
“Eu realmente tenho dificuldade em entender como um membro da advocacia pode afirmar inequivocamente que essa é uma ordem constitucional”, declarou o juiz ao advogado do governo Trump. “Isso me deixa perplexo.”
O advogado Brett Shumate, representando o Departamento de Justiça, disse que discordava respeitosamente e pediu ao juiz uma oportunidade de ter um briefing completo sobre os méritos do caso, em vez de emitir uma ordem de restrição de 14 dias bloqueando sua implementação.
Argumentando a favor dos Estados, o procurador-geral assistente de Washington, Lane Polozola, classificou como “absurdo” o argumento do governo de que os filhos de pais que vivem ilegalmente no país não estão “sujeitos à jurisdição” dos Estados Unidos.
“Eles não estão sujeitos às decisões dos tribunais de imigração?”, ele perguntou. “Eles não devem seguir a lei enquanto estiverem aqui?”
Essa decisão judicial é a primeira a tratar da ordem executiva que gerou fortes críticas em todo o país. Os processos argumentam que a 14ª Emenda à Constituição dos EUA garante cidadania para pessoas nascidas e naturalizadas nos EUA, e os Estados vêm interpretando a emenda dessa forma há um século.
A 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos foi adotada na segunda metade do século 19, como resultado da Guerra Civil, em um esforço para garantir os direitos dos antigos escravizados e de seus descendentes.
“Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e sujeitas à sua jurisdição, são cidadãs dos Estados Unidos e do estado onde residem”, declara a emenda.
O presidente de 78 anos reconheceu na segunda-feira, ao assinar a ordem, que sua ação enfrentaria desafios legais. “Vamos ver (…). Acho que temos fundamentos muito sólidos”, comentou quando questionado por jornalistas sobre o assunto.
A medida pode impactar centenas de milhares de pessoas nascidas no país, de acordo com um dos processos. Em 2022, houve cerca de 255.000 nascimentos de crianças cidadãs de mães vivendo no país ilegalmente e cerca de 153.000 nascimentos de dois desses pais, de acordo com o processo de quatro estados aberto em Seattle./AP e AFP.
Por Estadão