Entre as formas de tentar driblar as fiscalizações estava o registro da empresa que era incompatível com os procedimentos realizados
A empresária e influenciadora Karine Gouveia, suspeita de deformar pacientes, tentava burlar a fiscalização na clínica, segundo as investigações da Polícia Civil (PCGO). Alvo da operação Face Oculta, a empresa de estética, que leva o mesmo nome da dona, tinha registro com atividade econômica totalmente incompatível com os procedimentos cirúrgicos e invasivos que eram realizados no local. Uma forma de tentar despistar as fiscalizações, já que Karine Gouveia indicava procedimentos mesmo sem ter registro profissional ou qualquer formação na área.
Registro da empresa era incompatível com os procedimentos realizados
O registro da clínica de Goiânia perante a Receita Federal e a Vigilância Sanitária indica sua atividade econômica como pertencente a uma subclasse dos serviços de “Cabeleireiros e outras atividades de tratamento de beleza”, destinada à massagem e estética, totalmente incompatível com os procedimentos cirúrgicos e invasivos ali realizados.
Além disso, o estabelecimento funcionava com profissionais da área da saúde que realizavam cirurgias e procedimentos invasivos sem a devida qualificação técnica, descumprindo as normas editadas pelos respectivos conselhos profissionais. A unidade de Anápolis não tinha autorização da Vigilância Sanitária para funcionamento.
Karine Gouveia, sem qualquer formação acadêmica ou qualificação profissional na área da saúde, não apenas executava procedimentos que resultaram em sequelas, mas também assumia a função de atender, inicialmente, as vítimas que procuravam a clínica, segundo apontado nas investigações.
A influenciadora realizava anamneses e determinava a realização de procedimentos invasivos, incluindo cirurgias de atribuição exclusiva dos médicos, como rinoplastias, otoplastias, lipoaspirações e liftings faciais. Tais intervenções eram realizadas pelos demais envolvidos, sem a realização de exames preliminares, sem estrutura adequada (centro cirúrgico, anestesista, instrumentadores, etc.) e em condições insalubres.
Troca de nomes de procedimentos para disfarçar ilegalidade
Para atrair vítimas, disfarçar a ilegalidade das práticas realizadas e evitar questionamentos sobre a realização de procedimentos exclusivos de médicos, como rinoplastias, alectomias e otoplastias, o grupo criminoso anunciava tais intervenções sob nomes diferentes, como “reestruturação nasal HD” e “retração de orelha”.
Os procedimentos realizados pela organização criminosa resultaram em deformidades estéticas e funcionais permanentes. Até o momento, a PCGO conta com relatos de 24 vítimas que evidenciam complicações gravíssimas, sobretudo em intervenções no nariz.
Conforme o delegado Daniel Oliveira, muitas das vítimas relataram perda de função do olfato, abalo psicológico, além das deformações principalmente no nariz. Após o caso ser amplamente divulgado na quarta-feira (18), novas vítimas estão surgindo e a polícia civil esclarece que interessados podem procurar o 4º Distrito Policial de Goiânia.
Centro de distribuição de remédios
Até um centro de distribuição de remédios clandestinos foi encontrado no local. Segundo o delegado Daniel Oliveira, a clínica usava nome de médicos e de pacientes para solicitar remédios manipulados, comprados em larga escala para redistribuir a outros estabelecimentos.
Presos
Deflagrada, na quarta-feira (18), a operação Face Oculta, teve como objetivo o cumprimento de quatro mandados de prisão e sete mandados de busca e apreensão em Goiânia e Anápolis no âmbito de investigação relacionada a atuação da clínica. Conforme a Polícia Civil, no local eram realizados procedimentos e cirurgias estéticas de forma clandestina ao menos desde 2017, vitimando dezenas de pessoas que sofreram sequelas gravíssimas.
Foram presos na operação os proprietários e os responsáveis técnicos da clínica Karine Gouveia, sendo eles: Karine Giselle Gouveia Silva (34 anos) e seu marido, Paulo Cesar Dias Gonçalves (44 anos); e os responsáveis técnicos Daniel Ferreira Lima (odontólogo) e Jessica Moreira dos Santos (biomédica), profissionais que realizaram diversos procedimentos em áreas que extrapolavam suas atribuições regulamentares, ocasionando lesões corporais permanentes nos pacientes.
Conforme o delegado responsável pelo caso, foi pedida prisão temporária por 30 dias. Ainda, segundo a Polícia Civil, diante da gravidade dos fatos, foi apresentada representação ao Poder Judiciário visando ao encerramento das atividades da clínica e ao bloqueio de valores nas contas dos investigados, estimando-se um mínimo de R$ 100 mil por vítima, a título de reparação.
Crimes
Os crimes investigados incluem organização criminosa (Art. 2º da Lei n° 12.850/2013), exercício ilegal da medicina e arte dentária (Art. 282 do Código Penal), lesão corporal gravíssima (Art. 129, §2º, IV, do Código Penal), adulteração de produtos terapêuticos (Art. 273 do Código Penal), estelionato (Art. 171 do Código Penal), propaganda enganosa (Art. 66 do Código de Defesa do Consumidor) e realização de serviços de alto grau de periculosidade sem autorização (Art. 65 do CDC).
A divulgação da identificação dos presos foi procedida nos termos da Lei 13.869/2019, portaria n° 547/2021 – PC, e Despacho da Autoridade Policial responsável pelas investigações, justificadas na possibilidade real de identificação de novas vítimas.
O Mais Goiás não conseguiu contato com a defesa dos responsáveis técnicos Daniel Ferreira Lima (odontólogo) e Jessica Moreira dos Santos (biomédica), mas o espaço segue aberto para o devido posicionamento.
Defesa entrou com pedido de Habeas corpus
A defesa do casal Karine Gouveia e PC Segredo, o advogado Tito Amaral, informou em nota que entrou com pedido de Habeas Corpus para que eles respondam em liberdade. Veja nota na íntegra:
“Karine Gouveia e Paulo César são empresários.
Ela jamais praticou qualquer procedimento estético.
Já impetramos pedido de Habeas Corpus ao Tribunal de Justiça de Goiás e acreditamos que ainda hoje a prisão será revogada, vez que ela é absurda e, juridicamente, insustentável.
Até o momento não tivemos acesso ao inquérito, o que contraria a lei e as decisões do Supremo Tribunal Federal.
Tudo será devidamente apurado no momento oportuno e a verdade prevalecerá”.
Por Mais Goiás