Operador aponta incertezas sobre a recuperação dos reservatórios no período chuvoso, o que pode reduzir a energia armazenada nas hidrelétricas; Silveira avalia ‘custo-benefício’ da medida.
Indicadores compilados pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) nos últimos dias mostram um cenário de mais incertezas sobre o retorno das chuvas nos próximos meses, o que aumenta a pressão sobre o governo Lula para a adoção do horário de verão. A expectativa é de que o assunto entre na pauta do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), hoje, mas a semana começou com a atenção voltada para o apagão em São Paulo.
Na quarta-feira passada, 9, em reunião da Câmara de Monitoramento do Sistema Elétrico — que reúne integrantes das agências nacionais de Energia Elétrica (Aneel) e do Petróleo (ANP), da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e do Ministério de Minas e Energia —, o ONS informou que as projeções indicam piora nas condições de fornecimento de energia nos próximos meses.
Segundo o operador, nos dois cenários prospectivos, a água que deverá afluir para as represas das hidrelétricas deste mês até março de 2025 ficará abaixo da média histórica. No pior cenário, a energia armazenada nos reservatórios, ao fim do período de chuvas, ficará 23,4% abaixo da de março deste ano.
“As projeções indicam incertezas com relação ao início e condições do período úmido, apesar de alguns modelos enxergarem maior nível de precipitação a partir da segunda quinzena deste mês. Com a estiagem severa dos últimos meses, as próximas chuvas precisam, num primeiro momento, permitir que o solo recupere sua umidade para que, posteriormente, seja observada a elevação dos níveis das vazões”, afirma o ONS em nota sobre a reunião, disponível em seu site.
A recuperação dos volumes nas represas é esperada apenas para janeiro.
“O principal desafio identificado pelo ONS até dezembro é o atendimento da ponta de carga, horário em que a demanda atinge seu ponto máximo, que geralmente acontece entre 18h e 20h”, afirma.
É justamente nesse intervalo do dia em que o horário de verão mostra sua efetividade, segundo estudo apresentado pelo ONS no mês passado recomendando a adoção da política.
A nota técnica afirma que o horário de verão pode adiar em até 2h o momento de maior consumo à noite, quando a energia solar não está mais disponível. Dessa forma, seria possível economizar R$ 365 milhões no acionamento de termelétricas que encarecem as contas de luz.
Estiagem já põe País sob bandeira vermelha 2
Neste mês, em razão da estiagem, as contas de luz estão sob bandeira vermelha 2, ponto mais alto de sobrepreço na eletricidade. A medida incomodou o governo Lula e levou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, a recomendar que a Aneel use o valor acumulado (R$ 5,2 bilhões) na conta das bandeiras tarifárias antes de elevar a tarifa de energia elétrica.
Diferentes agentes que atuam no setor afirmam que não há risco de falta de energia, como em 2021, mas o preço da eletricidade está mais alto em razão da estiagem.
Quanto o horário de verão pode trazer de economia
Ainda de acordo com o estudo do ONS, caso seja mantido até 2028, o horário de verão pode produzir uma economia de R$ 1,8 bilhão por ano ao não acionar tanto as termoelétricas.
Mas se de um lado o governo lida com um aumento de preços, do outro, o horário de verão é uma medida que está com a popularidade em baixa, principalmente nos Estados do Sul e Sudeste, e enfrenta resistência em outros setores, como o aéreo.
Pesquisa do Datafolha divulgada nesta segunda-feira, 14, mostra que 47% dos entrevistados disseram ser desfavoráveis à medida, um empate em relação aos 47% apoiadores do horário de verão. É o pior resultado desde 2017 — naquele ano, o horário de verão era aprovado por 58%.
Na Região Sudeste, a desaprovação é de 51% ante 44% favoráveis. Isso ajuda a explicar por que o assunto não ganhou projeção no núcleo político próximo ao presidente Lula.
Durante seu mandato, Jair Bolsonaro (PL) evitou o tema, mesmo durante a forte crise de 2021, quando houve o risco de falta de energia. Na ocasião, o argumento do Ministério de Minas e Energia era o de que o horário de verão não produzia os resultados esperados de economia de eletricidade.
O ministro Alexandre Silveira chegou a defender a adoção da política logo após a conclusão do estudo do ONS, em meados de setembro, quando classificou a medida como “prudente e viável”.
Mas ele demonstrou dúvidas nos últimos dias. Na sexta-feira da semana passada, 11, Silveira afirmou que a volta do horário de verão estava condicionada ao risco de faltar energia e que o governo avaliava o seu custo-benefício.
“Nós estamos tendo todo o cuidado, toda a serenidade. O resumo da ópera é o seguinte: se houver risco energético, não interessa outro assunto a não ser fazer o horário de verão. Se não houver risco energético, será um custo-benefício que eu terei a tranquilidade, a serenidade e a coragem de decidir a favor do Brasil”, disse, em evento do grupo Esfera Brasil, na Itália.
Por Mariana Carneiro,
Estadão.