Não há dúvida de que o processo que começou ontem tem uma motivação política, ideia corroborada pela fragilidade das acusações.
O voto do relator do processo de cassação do senador Sergio Moro no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, desembargador Falavinha Souza, não foi arrasador apenas na negativa de todas as acusações apresentadas pela improvável, mas significativa, dupla partidária PL-PT, mas também pela quase denúncia de que tentativa tão esdrúxula de impugnação é, na verdade, “retaliação” e “desforra”.
Retaliação por parte do PT, devido à Operação Lava-Jato, que levou à prisão o hoje presidente Lula e vários de seus integrantes, devido à “grande investigação de combate à corrupção” que Moro comandou. Desforra por parte dos que não o quiseram como candidato à Presidência da República e resistem a engolir sua vitória eleitoral maiúscula. E também daqueles que, integrando o novo governo do PL, viram-no virar-se contra Bolsonaro e sair “desse governo atirando”. A derrota do ex-senador Alvaro Dias, “que lhe abriu a candidatura presidencial”, na corrida ao Senado do Paraná também foi arrolada indiretamente pelo relator como uma das razões para uma desforra política.
Não há dúvida de que o processo que começou ontem tem uma motivação política, ideia corroborada pela fragilidade das acusações. Já faz parte da história a saga de Moro na tentativa de se viabilizar como candidato à Presidência da República na disputa de 2022. Foi traído seguidamente pelas lideranças partidárias do União Brasil, depois de ter desistido de concorrer pelo Podemos por falta de recursos.
Acabou escanteado pelos políticos tradicionais, impedido de concorrer a deputado federal por São Paulo por denúncia do PT e obtendo uma eleição consagradora para senador pelo Paraná. O resultado até agora vai frustrando seus adversários, que já se mobilizavam rumo a uma eleição extraordinária para ocupar sua vaga, tão certa acreditam ser sua cassação.
O voto do relator Falavinha Souza pode mudar o rumo dessa prosa, tamanha a demonstração de que nenhuma das acusações se sustenta, simplesmente porque não aconteceu o abuso de poder econômico alegado. O desembargador José Rodrigo Sade, nomeado pelo presidente Lula com base em uma lista tríplice, é tido como voto contrário a Moro, mas pediu vista, o que torna incerta sua posição.
O fato de Moro ter sido candidato a presidente da República antes não significa que tenha manobrado para ficar em evidência e se aproveitar disso para se eleger senador. Como ressaltou o relator, além de as acusações não procederem, ele não precisava dessa artimanha porque já era uma figura nacional, não apenas por ter sido o juiz da Lava-Jato, como por ter saído do governo de maneira estrepitosa, denunciando a tentativa de Bolsonaro de interferir na Polícia Federal do Rio.
O atual governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que foi candidato a presidente e depois se reelegeu governador, foi citado como exemplo de que mudanças de candidatura acontecem corriqueiramente na política brasileira. Dois fatos atuais ajudam Moro: o desvendamento do caso Marielle, que mostrou por que Bolsonaro e família queriam ter o controle da PF no Rio; e a admissão da empresa suíça Trafigura, multada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos em US$ 127 milhões por admitir que seus executivos subornaram funcionários da Petrobras na compra de barris de petróleo.
Embora, aqui no Brasil, a Operação Lava-Jato venha sendo cuidadosamente enterrada em decorrência de decisões do Supremo Tribunal Federal, paradoxalmente no resto do mundo as acusações e as punições continuam acontecendo, o que coloca a legislação brasileira em confronto com a realidade e em oposição à visão da maioria da sociedade brasileira, como mostram as pesquisas de opinião.