Na percepção dos pais, mais da metade dos estudantes matriculados em escolas públicas no Brasil não têm aulas de reforço para compensar as perdas geradas pela pandemia de Covid-19 e também não recebem apoio psicológico adequado. Os dados são da pesquisa Educação na perspectiva dos estudantes e suas famílias realizada pelo Datafolha, que entrevistou 1.308 pais e/ou responsáveis por 1.869 estudantes, a pedido do Itaú Social, da Fundação Lemann e do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
Segundo o levantamento, a maioria das escolas oferece algum tipo de atividade para compensar as perdas deixadas pela pandemia — 94% delas. No entanto, apenas 39% dos alunos conseguem participar das aulas de reforço.
A desigualdade econômica, como já observado em pesquisas anteriores, chama atenção. Segundo o levantamento atual, entre os alunos de escolas públicas com maior nível socioeconômico, 43% conseguem acompanhar as atividades contra 33% com menor condição social e financeira.
Essa desigualdade também fica evidente entre as regiões do país: no Sul, o percentual de estudantes cujas escolas dão aula de reforço é de 53%, enquanto no Nordeste esse número cai para 28%.
“A pesquisa funciona como um termômetro de como estamos”, avalia Lucas Rocha, diretor de projetos na Fundação Lemann. “Percebemos que os estudantes mais pobres, justamente aqueles que tiveram mais dificuldade de acesso ao ensino remoto durante a pandemia, deveriam ter prioridade no reforço escolar e não estão sendo atendidos como deveriam pelas políticas públicas.”
O levantamento buscou avaliar, além da questão da aprendizagem, a busca ativa escolar — ação que evita o abandono — e o acolhimento e saúde mental de alunos e professores. Segundo os pais ou responsáveis, 74% dos estudantes estão matriculados em escolas que entram em contato com a família quando o estudante não vai à aula.
“Esse é um dado positivo, uma vez que as escolas entram em contato, mas o alerta continua quando observamos que 21% dos alunos pensam em desistir e esse número vai para 28% quando olhamos para os estudantes do ensino médio”, observa Rocha.
A perda pelo interesse nos estudos segue sendo o principal motivo (32%), principalmente nos anos finais do ensino fundamental (37%). Já a falta de acolhimento subiu entre dezembro de 2021 e maio deste ano (15% vs. 23%, respectivamente).
Entre os que participam de ações de apoio psicológico ou de reforço escolar, a avaliação é que elas contribuem muito — 74% e 70%, respectivamente. Vale observar que, pela perspectiva dos pais, apenas 4 em cada 10 escolas oferecem apoio psicológico ou aulas de reforço escolar (39%).
Ainda, de acordo com o estudo, 14% das famílias recebem algum recurso financeiro da Secretaria da Educação, como auxílio ou bolsa, vinculado à presença ou à participação do aluno nas atividades escolares.
Entre os que participam de ações de apoio psicológico ou de reforço escolar, a avaliação é que elas contribuem muito (74% e 70%, respectivamente).
“Precisamos ter cautela quanto às atividades de reforço porque muitas vezes as escolas promovem atividades no horário de aula e os pais só consideram as atividades no contraturno, mas de qualquer maneira, estão sinalizando que ainda precisa melhorar”, destaca o diretor de projetos da Fundação Lemann. “Também destacamos ser necessário estabelecer prioridades de conteúdo, agrupar os alunos de acordo com o nível de conhecimento para que o professor tenha um foco melhor nas necessidades de cada um.”
O período de isolamento imposto pela pandemia deixou marcas entre as crianças e adolescentes. Como mostra a pesquisa, 34% dos estudantes estão tendo dificuldades para controlar as suas emoções, segundo suas famílias. No ensino médio, o número chega a 40%. Além disso, 24% estão se sentindo sobrecarregados e 18% estão tristes ou deprimidos.
“Um aluno que não aprendeu nada e tem de encarar uma prova vai se sentir desmotivado ou ansioso, também precisamos considerar que a escola é um espaço para a socialização, para atividades físicas e até para o vínculo com outros adultos fora da família e o papel para o acolhimento é importante”, observa Rocha. “As escolas precisam ter uma equipe prepara para ouvir atentamente os alunos e promover atividades lúdicas como gincanas, por exemplo.”